"Até mesmo o silêncio é um texto."

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Parte Terceira

O beijo começou leve e carinhoso enquanto estávamos sentados junto a parede, mas depois acabei por deitá-la no chão forrado de carpete daquele corredor do último andar. Joguei meu corpo sobre o dela e começamos a nos beijar vorazmente. Eu tentava agarrar todas as partes daquele corpo ao mesmo tempo, enquanto ela apertava minhas costas, de modo a colar meu corpo no seu. Fiz uso das pernas para deixá-la ainda mais louca. Quando ela chegava num ponto de loucura, de me apertar vorazmente contra o próprio corpo, eu desacelerava. Voltava a beijá-la carinhosamente, acariciando seu cabelo. E então aumentava gradativamente o ritmo até chegar ao êxtase novamente. Numa dessas, ela jogou-me para o lado e se pôs em cima de mim, assumindo o controle de nosso descontrole. Minhas mãos passeavam de cá pra lá e então infiltraram-se no sutiã. Quando eu tinha tudo nas mãos, ela parou, levantou a cabeça e o corpo, permanecendo sentada/ajoelhada sobre mim.
- Para Gaúcho, ou eu vou transar com você aqui mesmo...
- Eu não to fazendo nada... - e sorri com inocência.
Ela fez uma negativa com a cabeça e deitou-se em cima de mim, beijando meu pescoço, afastando meu moletom para chegar ao ombro e todo e qualquer pedaço de pele que ela podia alcançar com a boca.
- Ai Gaúcho... - ela sussurrava aqui e ali.
Ficamos naquele esfrega-esfrega por alguns minutos, até que resolvi que era hora de descermos. Tomamos o elevador. Ela entrou primeiro, apertou o botão do terceiro andar e recostou-se ao lado dos botões. Eu entrei e posicionei me do outro lado. Estávamos frente-à-frente, separados por menos que meio metro pelo qual se podia enxergar o espelho.
Olhei meu reflexo. Cabelos bagunçados, moletom amarrotado. Dei um jeito no cabelo.
- Não pode desarrumar meu penteado assim - repreendi distraidamente.
- Gaúcho...
Quando terminei os reparos e voltei a recostar-me na parede do elevador, ela aproximou-se e pôs-se a ajeitar a gola da minha camiseta polo por sobre a gola V do moletom. Depois que terminou, como quem não quer nada, arriscou mais algumas investidas no pescoço. Subiu com a boca, procurando a minha, mas, ao chegar, encontrou apenas uma orelha. E, não se dando por vencida, mordiscou o lóbulo e, confesso, causou algum arrepio no meu couro. Deve ter percebido, pois recuou, com um meio-sorriso de garota se fazendo de difícil. Eu sorri um "entendi" e voltei-me pro espelho, colocando a gola de volta para dentro.
- Eu não uso assim. Todo mundo ia pensar que eu andei tirando a roupa...
- Seria bom se tivesse tirado.
- Talvez. A gente nunca vai saber.

Saímos do elevador e chegamos à porta do nosso apê. O cheiro de cebola estava naqueles corredores por anos e, depois de uma semana, já não incomoda mais tanto. Apartamento 17. Sempre adorei o tal dezessete. Não o apartamento, mas o número. Algo nele é bonito. Algo nele é ímpar, rá! Algo nele faz sentido, e é difícil explicar isso. Mas eu não tenho que explicar nada pra ninguém mesmo.
Entramos, mas não antes de ela tentar algo.
Ela foi ao banheiro e eu fui à sala. Olhei ao redor, silêncio. Recostei-me no sofá, mirando a noite escura pela janela. Cheiro de roupa lavada, que secava no varalzinho de armar. As outras gurias deviam já estar dormindo, ou transando lá no quarto que eu dividia com elas. Nah, não. Sorri sozinho.
Ela saiu do banheiro e parou na entrada da sala/cozinha.
- Você vem?
- O que o teu namorado ia pensar?
- Ele não tá aqui...
- Hm, mesmo assim. - Sorri.
- Boa noite, então?
- Boa noite.
- Ai, Gaúcho...
- Durma com os anjos.
Ela então saiu e eu a ouvi entrar no próprio quarto. Demorou um pouco para trancar a chave, porém. Eu era mais complicado do que eu pensava e era inútil ficar ali parado pensando no que eu eu fazia ou por que fazia. Era mais fácil escrever. Mais divertido, também. Mas, mais importante, é que dias ou meses ou anos depois eu iria ler e julgar. Talvez descobrir os porquês e tentar entender como se comportava o meu próprio ser. Lembrei das latas na geladeira. Abria a primeira enquanto o computador iniciava. Sentei, vendo que alguma claridade já começava a querer aparecer no horizonte, lá, além da janela. Tomei o primeiro gole e digitei as primeiras palavras, sem imaginar que ainda teria de escrever muitas outras.